Educação fora da caixa


                Recentemente tive a honra de organizar um evento para professores da rede pública municipal e intitulei o evento como “Seminário de Educação fora da caixa”, o termo "fora da caixa" é muito utilizado nas empresas ao redor do mundo. Fiz questão de trazer para refletirmos na educação pública e os seus desafios na era da informação.
        A ideia central de pensar fora da caixa é a busca constante por alternativas não convencionais, criativas e inovadoras para problemas cotidianos e antigos. Nessa lógica, vejo que a educação brasileira vem utilizando formatos que davam certo no século XX, quando as famílias, o trabalho e as relações sociais eram totalmente diferentes. Peço que vocês reflitam ou pergunte como eram as escolas no tempo dos seus pais, dos seus avós. Indubitavelmente, vocês perceberão que mudou pouco ou quase nada. Em geral dirão que era uma professora em frente a uma, duas ou três dezenas de alunos, escrevendo
textos quilométricos no quadro com giz e reafirmando a necessidade de copiar cada palavra ipsis litteris. Todavia, o mundo além dos muros da
escola foi se transformando, em pouco mais de 100 anos passamos pela 2ª, 3ª e estamos na 4ª revolução industrial. As mulheres ingressaram
fortemente no mundo do trabalho e foram desbravando cada vez mais espaço, o computador foi inventada, a indústria foi automatizada, a
internet conectou pessoas no mundo inteiro, as famílias se reconfiguraram e os jogos digitais, praticamente, substituíram os pais
e as babás.
             Se pensarmos amplamente veremos muitas melhorias, pois ao longo das últimas cinco décadas a educação foi universalizada e o Brasil saiu de 39% de analfabetismo para 6,8, sendo que em 2018 menos
de 5% das crianças em idade escolar estão fora da escola. Dentre as várias ações, destaca-se a Lei de Diretrizes e bases da educação em 1996 e o FUNDEB criado em 2007 que garante o financiamento da educação básica até o final de 2020, além disso, desde 2013 o ensino fundamental foi ampliado para crianças a partir dos quatro anos.  A educação brasileira cumpriu seu primeiro papel que é de tirar a
absoluta maioria do analfabetismo, todavia ainda há muito para fazer.
        A “caixa” está criada, existe um caminho sólido já percorrido, mas hoje urge uma nova forma de educar/ensinar que vem sendo tratada pela academia há bastante tempo, entretanto não vem sendo ouvida.
Desde Paulo Freire já se fala em uma educação diferenciada, com foco no aluno e os olhos para o mundo, ou seja, educar fora da caixa. Mas quem ouve tais reivindicações além dos próprios educadores/professores?
               Os principais modelos que deram certo no passado deixavam a responsabilidade de ensinar para o professor, o poder do conhecimento estava na escola e essa forma de pensar deu certo por muito tempo. A fonte de conhecimento era a escola e o professor que gozava de plena confiança e respeito dos pais que também haviam sido criados naquela realidade (professores são autoridades).
                Os anos 2000 chegaram, a comunicação de massa e o acesso à informação foi sendo democratizada de forma rápida e em menos
de duas décadas quase todas as crianças em idade escolar passaram a ter acesso a qualquer conteúdo em alguns toques na tela de um tablet ou smarthphone. Assim como em qualquer fase da história, as transformações apresentam seus efeitos colaterais, entre eles o afastamento dos pais da formação dos filhos e essa mesma família transfere toda a responsabilidade da formação integral dos seus filhos para a escola e os professores que entendo ser o mais grave. Nesse sentido, naturalmente, os professores e escolas não dão conta dessa demanda e são criticados por isso, deslocando suas energias na busca por soluções que são inalcançáveis, além de todo o desgaste da falta
de investimentos sólidos em questões básicas como a valorização da atividade docente através de salários justos e educação continuada.
Diante desse cenário, como pensar em uma mudança na intensidade e rapidez que o momento pede?
                Entendo que a escola do século XXI passará pelas seguintes atitudes:
        - Parar de olhar para o passado quando modelos extremamente regrados, tipo quartéis ou internatos que foram bem sucedidos, mas hoje a necessidade é de ouvir os estudantes, valorizar a pluralidade e
flexibilidade na construção da aprendizagem.Esse modelo, que não é adotado em nenhum país de referência em educação, inviabilizaria competências como criatividade, inovação e autonomia tão necessárias para a vida no século XXI.
        - Conscientizar e corresponsabilizar a família pela formação escolar e cidadã dos seus filhos. Os pais precisam participar ativamente da escola e junto aos profissionais conduzirem seus filhos para uma formação sólida. Por fim, a educação precisa ser focada na iniciação científica, na experimentação com ênfase na aplicabilidade cotidiana de cada aprendizado.
                Educar fora da caixa é valorizar os professores e incentivá-los a buscarem alternativas pouco convencionais para que a escola se torne cada vez mais atraente para os alunos e que seja capaz de envolver as famílias na formação dos seus próprios filhos. A missão não é fácil, mas é necessário e urgente que nos arisquemos.


Comentários